14 julho, 2012

Dessossego




De repente e com tom de razão. Lá fora no cesto alto onde os cães divertem-se noite a noite estão agrupados os meus sentimentos. Tão longe de mim escorre sangue pelo negro pacote descartável. Fico cá composto de saudade olhando pela fresta que encontro entre um e o outro lado da cortina. Desejo certamente que ninguém lá fora enxergue minhas lágrimas, mas pouco ligo para o cheiro de decomposição das lembranças. Sobre o vidro embaçado escrevo palavras fortes e tristes, respiro fundo e depois de novamente embaçado escrevo amor, escrevo esperança, escrevo ‘eu te amo’, assim mesmo desta forma: com aspas, para não esquecer que é apenas teoria. Retiro-me dali e finalmente livro-me de recordações. Um, dois, três passos e um tropeço para trás e posso ver embaixo do repouso um baú. Evito tocá-lo mesmo sabendo que por meu corpo não percorrem sensações. Me nego, deixo ele estático, levanto-me entre cambaleios e ponho meu corpo em descanso. Olho para o brilho no teto e sorrio. Então toma posse de mim a preguiça. Fecho os olhos, faço uma única e rara oração. Com a luz acesa, coração vazio e solidão: oscilo desmaio.